Uma Vampira na Amazônia: Camille Monfort
Uma Vampira na Amazônia: Camille Monfort – Vampiros na Amazônia não deveriam causar espanto nos leitores e leitoras da Rede Vampyrica e tampouco em toda a nossa vasta comunidade da América Latina e Portugal.
Se recuarmos para o final dos anos sessenta há um relato de uma loira vampira de vestido curto e meias pretas, muito sensual por lá que chegou até nos tablóides ingleses (leia mais aqui) e causou grande frisson. Outra assombração popular naquelas terras é a de Josefina, uma fantasma que sempre viaja de taxi e pede ao motorista para que cobre a corrida de sua família (leia mais aqui, obrigado Edu G. e Cuca, pelo acréscimo).
A própria floresta ser chamada de Amazônia remete as misteriosas amazonas dos mitos gregos. Nos anos oitenta houveram até pesquisadores que comparavam a foz do amazonas a entrada do Hades na saga de Homero. Algo evocativo e interessante dentro do amplo espectro do imaginário e da criação ficcional. Histórias inspiram.
Se tomarmos a questão de maneira mais ampla e pré-colombiana não faltam deidades com longas presas afiadas esculpidas na rocha e xamãs trajados de morcego ao norte do nosso continente, vide Chávin de Huantar, lá no Peru como um exemplo. Eles existiram ao longo de séculos passados. Mas há outros, muitos outros. Reparem que as américas do sul e central dispõem de uma das mais ricas diversidades de tipos de morcego que outros continentes do globo – incluindo os hematófogos.
No Brasil temos mais de 170 anos de produção cultural vampírica, o vampiro em nossa cultura não começa no final dos anos sessenta. Abordamos tudo isso nos links que seguem:
A cidade de Belém já é uma velha conhecida da gente, devido ao evento Vampire Fest da parceira Luna Angel, que celebra 7 anos em novembro (logo falaremos dele por aqui). Lá (mais ou menos) perto, em Manaus temos ainda o Dan Leal, da websérie “Sede Incontrolável” de 2014 que abordou uma ficção de vampiros que viviam na região, saiba mais. O Brasil é um país quase transcontinental, onde raramente é possível conhecer de perto e a produção cultural de temática sombria e noturna que desponta por aí sempre coloca pequenos achados em nosso radar.
Camille Monfort é uma personagem fictícia criada pelo escritor paraense Bosco Chansen, e está aparecendo bastante na internet e redes sociais chamando a atenção para as lendas urbanas da sua cidade. Ela é parte do repertório do livro Após a Chuva da Tarde. O livro tem aquela pegada de realismo fantástico, aquela escola literária que mescla criatividade dos autores, lendas urbanas e realidade. Seus nomes mais conhecidos foram Louis Pauwels e Jacques Bergier, exemplares pontuais neste estilo de narrativa parte real e parte fantástica – na fronteira do cotidiano e de algo além.
Hoje esta mesma arte de reunir relatos, lendas urbanas, “aconteceu comigo”, visagens e afins se desenrola em incontáveis podcasts através de toda a internet. De pessoas que gravam comunicações com mortos e outros seres, a contadores de história variados por toda parte. São boas histórias assustadoras que remetem aos causos contados no interior e que oferecem uma sobrevida ao folclore brasileiro em muitos frontes.
No texto que segue reproduzimos a postagem do autor, as imagens sugeridas por ele para ilustrarem sua história e disponibilizamos ao final o link para a aquisição do livro. A personagem em questão é fictícia. Segundo moradores de Belém as fotos do suposto jazigo onde repousa a vampira é do túmulo de uma outra família de lá, do senador Justo Chermont, no cemitério da Soledade. E o retrato que tornou a personagem popular na internet e redes sociais é de uma jovem possivelmente inglesa supostamente da época da primeira guerra mundial. Houve até uma especulação sobre uso de IAs na criação da imagem por conta do “carte cabinet” (estojo para cartões de visita) que ela segura parecer um celular em 1900´s. Enfim, vamos a reprodução do texto que circulou nas redes sociais:
CAMILLE MONFORT: A Vampira da Amazônia (De Bosco Samsa)
No ano de 1896, Belém enriquecia com a venda da borracha amazônica para o mundo, enriquecendo fazendeiros, da noite para o dia, que construíam seus ricos palacetes com materiais vindos da Europa, enquanto suas esposas e filhas mandavam suas roupas para o velho continente para serem lavadas e importavam água mineral de Londres para seus banhos.
O Theatro da Paz era o centro da vida cultural da Amazônia, com concertos de artistas europeus. Entre eles um chamou especial atenção do público, a bela cantora lírica francesa Camille Monfort (1869 – 1896), que causou desejos inconfessáveis em ricos senhores da região, e ciúmes atrozes em suas esposas por sua grande beleza.
Camille Monfort também causou indignação por seu comportamento livre das convenções sociais de seu tempo; [ela era vista, seminua, a dançar pelas ruas de Belém, enquanto se refrescava sob a chuva da tarde]; e também despertou curiosidade por seus solitários passeios noturnos, quando a viam com seus longos vestidos negros esvoaçantes, sob a lua cheia, à beira do Rio Guajará, em direção ao Igarapé das Almas.
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Logo, ao seu redor, boatos se criaram e deram vida a comentários maledicentes. Dizia-se que ela era amante de Francisco Bolonha (1872 – 1938), que a trouxera da Europa, e que este lhe dava banho com caríssimas champanhes importadas da
Europa, na banheira de seu palacete; dizia-se também que ela fora atacada pelo vampirismo em Londres, devido sua palidez e aspecto doentio, e que trouxera este grande mal à Amazônia, possuindo misteriosa necessidade de beber sangue humano, ao ponto de hipnotizar jovens mocinhas com sua voz em seus concertos, fazendo-as adormecerem em seu camarim, e terem seus pescoços sugados pela misteriosa dama.
[O que, curiosamente, coincidiu com relatos de desmaio nas dependências do teatro durante seus concertos, que eram explicados como apenas o efeito da forte emoção produzida por sua música aos ouvidos do público].
Dizia-se também que ela possuía o poder de se comunicar com os mortos e materializar seus espíritos em densas brumas etéreas de materiais ectoplásmicos expelido de seu próprio corpo em sessões mediúnicas. [Eram, sem dúvida, as primeiras manifestações na Amazônica do que mais tarde viria ser chamado de Espiritismo, praticado em misteriosos cultos em palacetes de Belém, como o Palacete Pinho].
No final de 1896, um terrível surto de cólera devastou a cidade de Belém, fazendo de Camille Monfort uma de suas vítimas, sendo sepultada no Cemitério da Soledade.
Hoje, sua sepultura ainda está lá tomada pelo limo, musgo e pelas folhas secas, sob uma enorme mangueira que faz seu túmulo mergulhar na obscuridade de sua sombra, apenas clareada por alguns raios de sol que se projetam por entre folhas verdes. É um mausoléu de linhas neoclássicas com um portão fechado por um velho cadeado enferrujado, de onde pode-se ver um busto feminino em mármore branco sobre a ampla tampa do túmulo abandonado; e, fixado à parede, uma pequena imagem emoldurada de uma mulher vestida de preto; em sua lápide pode-
se ler a inscrição:
Aqui Jaz
Camille Marie Monfort (1869 – 1896)
A Voz que Encantou o Mundo
Mas há aqueles que, ainda hoje, dizem que seu túmulo está vazio, que sua morte e enterro não passaram de encenação para acobertar seu caso de vampirismo; e que Camille Monfort ainda vive na Europa, hoje aos 154 anos de vida.
Quando você visitar o Cemitério da Soledade, em Belém, não esqueça de visitar
seu túmulo, e lhe depositar uma rosa vermelha; e não se assuste se, noutro dia, a
rosa tenha se tornado sangue.
Sobre o Autor:
Bosco Chancen vive em Belém do Pará, coleciona casos misteriosos e lendas locais; possui um blog (Bornal) onde publica seu acervo de casos. É autor do romance Após a Chuva da Tarde, onde explora as semelhanças entre a lenda do
boto e lendas vampíricas europeias para construir uma história vampírica baseada em acontecimentos históricos da cidade de Belém, e reinterpreta o mito de Orfeu e Eurídice por meio dos mitos amazônicos.
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