Amor e morte: relembrando o caso Sophie Lancaster
Boa noite, meu caro leitor.
Hoje foi um dia para celebrarmos nossa liberdade, nossa existência e resistência através das décadas. Mas, também foi um dia para lembrar aqueles que tiveram suas vidas ceifadas ou modificadas de forma permanente após serem vítimas da intolerância e/ou ignorância, simplesmente por sustentarem um estilo de vida ou um guarda-roupa bastante distinto e diferente do que é tido como padrão, comum ou normal.
E é impossível não se lembrar de Sophie Lancaster ou dos 3 de West Memphis.
Aos que não conhecem ou que não estão familiarizados com o caso Sophie Lancaster, peço que leiam esta postagem até o fim.
Amor e Morte
11 de Agosto de 2007 – Bacup, Lancashire, Inglaterra.
Sophie e Robert já tinham experimentado algumas agressões verbais de pessoas que os chamavam de vários nomes por se vestirem de forma diferente, por terem uma aparência diferente. Mas uma coisa era certa: jamais poderiam imaginar o que esperava por eles naquela madrugada de sábado em seu caminho de volta para casa após sair da casa de Jonathan, um amigo que tinham em comum.
No caminho para casa, o casal parou em um posto de gasolina, comprou cigarros e conversou com um grupo de adolescentes intrigados pela sua aparência; uma garota tirou fotos. Robert, estudante de artes, tinha um piercing no lábio, costumava pentear seus cabelos a la Robert Smith e usar maquiagem. Sophie, estudante exemplar que planejava cursar Inglês no ano seguinte, tinha diversos piercings faciais e dreadlocks verdes.
Próximo à área de skate do Parque Stubbylee, o casal parou para conversar com um grupo de jovens desconhecidos, que bebiam e pareciam se divertir por ali. A conversa era amigável, até mesmo compartilharam cigarros. Mas, de repente, o clima mudou e Robert teve sua cabeça chutada por Brendan Harris, líder de uma gangue juvenil que se intitulava “O Grupo de Terror de Bacup”. O golpe fez com que ele fosse ao chão, para em seguida ter sua cabeça chutada por outros dois garotos da gangue, o que causou sua perda de consciência. Sophie, sem entender o que acontecia e clamando por misericórdia, debruçou-se sobre seu amado e o protegeu com seu próprio corpo para que não recebesse mais chutes e pisadas, mas isso não impediu de que eles continuassem com as agressões que então se voltaram contra ela, até que ela também perdesse a consciência.
Fugiram do local, mas vangloriavam-se do seu feito para seus amigos. Tinham espancado dois “moshers” (termo pejorativo utilizado para qualquer pessoa diferente do padrão) e os deixado à beira da morte.
Diversos jovens que testemunharam a agressão começaram a ligar para o serviço de emergência. Jonathan, aquele amigo do casal, foi o primeiro a saber que algo de errado tinha acontecido com os seus amigos quando recebeu uma ligação partida do celular de Robert, na qual um garoto dizia que seus amigos estavam quase mortos no Parque Stubbylee. Jonathan correu para o parque, mas ao chegar lá, o local já estava sendo isolado pela polícia que o conduziu ao hospital para onde tinham sido levados. Ele logo reconheceu Robert, mas não deixaram que ele visse Sophie, porém a reconheceu pelos poucos dreadlocks que tinham sobrado presos à sua cabeça.
Robert teve uma hemorragia cerebral que os médicos conseguiram conter, mas mesmo assim carregará para o resto da vida as sequelas de tamanha brutalidade, além do trauma de perder sua namorada com quem pretendia se casar, com quem pretendia compartilhar sua vida. Ele ainda culpa-se por não ter conseguido proteger sua amada, por não ter simplesmente podido gritar para ela correr e deixá-lo morrer em seu lugar.
Sophie nunca mais acordaria. Seu namorado e seus familiares jamais veriam aquele sorriso gentil de uma garota tímida e doce, sonhadora como muitas garotas de 20 anos.
Após 13 dias em coma profundo, completamente desacreditada pelos médicos, os pais concordaram em desligar as máquinas que mantinham seu coração e pulmões funcionando.
6 de Setembro de 2007
Cinco garotos com idade entre 15 e 17 anos foram levados ao tribunal após intensa investigação e o depoimento de diversas testemunhas. Brendan Harris (15) e Ryan Herbert (16) foram julgados e condenados à prisão perpétua pelo assassinato de Sophie. Outros três garotos tiveram sentenças menores ao serem considerados culpados pela agressão física praticada contra Robert.
10 de Março de 2010
Sylvia Lancaster, mãe de Sophie, após receber uma quantidade enorme de relatos de ataques a outros jovens pelos mesmos motivos que sua filha foi atacada, criou a The Sophie Lancaster Foundation que tem como objetivo educar os jovens em relação às culturas e subculturas diferentes e alternativas, conseguir que as autoridades considerem crimes de ódio os ataques contra os membros dessas culturas e subculturas e também para manter viva a memória de Sophie.
Que assim seja.
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