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Entre a Pomba e a Serpente: Assistimos CHRISTABEL de Alex Levy-Heller

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Entre a Pomba e a Serpente: Assistimos CHRISTABEL de Alex Levy-Heller hoje oferecemos um olhar afetivo sobre o filme! Neste review vamos falar sobre o novo filme do cineasta brasileiro que na data desta publicação já estava na sua segunda semana de exibição nas salas de cinema brasileiras. Um feito bastante importante na indústria do cinema local quanto mais tempo em cartaz melhor. Tenho certeza que se não fosse por estes tempos de pandemia certamente as salas estariam lotadas por muitos cinéfilos para contemplarem esta obra de arte. E nós assistimos e recomendamos Christabel de Alex Levy-Heller. Definitivamente o trailer anuncia, faz a promessa de uma boa história de vampiros e o filme entrega com maestria o que promete. Mas não espere ritmos alucinados ou blockbusters, é um filme de arte e muito bom, orgulho de sabermos que há diretores incríveis no Brasil. Enfim, estamos Entre a Pomba e a Serpente: Assistimos CHRISTABEL de Alex Levy-Heller

CHRISTABEL DA POESIA AO CINEMA

Transformar uma poesia em filme é um desafio e tanto. E quando essa adaptação é da primeira e maior poesia vampírica já escrita pelo grande Samuel Taylor Colleridge temos um desafio realmente grandioso. Christabel vem dos fins do século XVIII escrita por um arrasado Coleridge com as péssimas experiências vividas após a publicação Rhyme of Anciet Mariner. De certa maneira a vampira Geraldine marca o retorno da deusa-vampira e do paganismo que o condenou socialmente e lhe deixou com alguns vícios. Eram tempos bem mais severos do que os nossos em muitos sentidos – e não adianta muito olharmos para eles e tentarmos transportar nossa visão de hoje para entende-lo. Vale pontuar que mesmo você não conhecendo a poesia ou o seu contexto você encontrará um filme fantástico. Mas como esta é a Rede Vamp vamos contextualizar um pouco mais afinal é um filme sobre Christabel, não é verdade?

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É verdade que Christabel é uma poesia não concluída, o autor só escreveu duas partes que não conseguiu ofereceu um desfecho. Sobrou para o diretor Alex Levy interpretar e imaginar um final, que devo acrescentar foi soberbo. Embora as duas partes da poesia datem de 1797 e 1800 a terceira parte nunca foi escrita. Christabel só foi publicada em 1816 juntamente com Kublai Khan. O manuscrito foi lido pelo grande Percy Shelley, que surtou a correr pela velha mansão aonde estava até ser encontrado pelos convivas em pânico debaixo de uma mesa coberta por uma toalha – murmurando algo sobre um olhar e o seio. Partes do mistério da obra. Outro ponto são as menções a Pomba e a Serpente que formam trechos importantíssimos de um diálogo da poesia – que falaremos adiante. Aliás, se você quer mesmo entender a importância de Christabel no imaginário Vamp, leia este nosso outro artigo.

ENTREVISTA EXCLUSIVA COM O DIRETOR ALEX LEVY HELLER

CHRISTABEL IMPORTA

Christabel permanece bastante atual, mesmo quando você remove dela o visual luxurioso e extravagante de época – retira os castelos e as intrigas palacianas trazendo o espírito para uma fábula cabocla no interior do cerrado de Goiás, aqui no Brasil. O tom melancólico da poesia inglesa logo reveste toda a vastidão do cerrado. Encontramos tom lânguido não preocupado em responder uma audiência inquietante. Aquela elegância que deixa o filme aberto a interpretações do será que é só o devaneio da bela Christabel ou há realmente uma vampira nas águas do rio ou atrás dos lençóis pendurados no varal ao poente. Será que há realmente uma mulher que foi salva na escuridão da noite ou essa era a ignorância da personagem sobre si e viver uma vida mais próspera?
E sussurra Geraldine: “Sonho é para quem quer ficar dormindo.” Ainda assim há incontáveis cenas que a fotografia remete aos clássicos da Hammer e da Universal – o que oferece um alento para os fãs e uma motivação para rever e encontrar mais referências. E elas estão lá mesmo como assegura o diretor. Um confesso fã de histórias vamps.

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A VAMPIRA GERALDINE E SUAS TRANGRESSÕES INTELIGENTES

Outro ponto que destacamos é a performance das atrizes Milla Fernandez (Christabel) e Lorena Castanheira (Geraldine) que na interpretação e no jogo de sedução entre a vampira e a vítima; bem como nos momentos de deleite em nenhum momento caem no tom caricato ou numa abordagem vulgar. Há momentos marcantes como o banho de cachoeira das personagens que nos transportam as obras do italiano Fellini e de outros clássicos filmes de vampiros de lá. Destacamos o cuidado especial com as cores, fotografia de Vinicius Berger – que mostra, insinua ou simplesmente não revela os momentos ao seu gosto quase como um personagem a parte – que torna a experiência de assistir ainda mais interessante. Outro personagem que adoramos foi o trovador e sanfoneiro – mas dele não falaremos para não estragar surpresas e sua importância na trama.

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ENTRE A POMBA E A SERPENTE: O ESPÍRITO SANTO E SATÃ NO JARDIM DAS DELÍCIAS

Há uma interessante passagem no filme sobre a pomba branca e a serpente esverdeada que certamente atrairá aos mais inclinados a cosmovisão, mística e espiritualidade. Onde Christabel é comparada a boa alma e a pureza. Que justamente por isso será tentada e experimentará a queda.

Já a vampira Geraldine aos desejos da carne a natureza que tenta pelos prazeres da carne e do mundo. Que oferecerá inúmeras camadas de abordagem para os Vamps mais filosóficos. A referência a tentação de Eva no Jardim do Éden é perfeita.

Conversando por telefone com meu nobre amigo Marcelo Del Debbio (Kabbalah Hermética e Enciclopédia de mitologia) concluímos que é dificil não pensarmos no Espírito Santo tentado por Satã, tema clássico nos séculos XVII e XVIII no Reino Unido. Como a cegueira dos prazeres e do materialismo podem nos roubar de uma vida mais frugal. Ao mesmo tempo a Pomba e a Serpente, na India que era colônia da Inglaterra e de onde migravam os mitos que as escolas de mistério européias tentavam interpretar – poderiamos pensar na serpentária Geraldine como uma alegoria para a Kundalini a despertar na jovem Christabel em meio a solidão e o isolamento no cerrado. O que de certa maneira é expresso no filme veladamente. Mas essas são especulações de dois velhos amigos ocultistas.

A tentação do espírito pela serpente é um tema universal. E nos remete ao fruto proibido no Jardim do Éden. Consultando a obra Uthark – Lado Noturno das Runas, do amigo Thomas Karlsson (que nos visitou recentemente no Brasil, leia aqui), temos em especial no capitulo sobre Heldrasil que: A mensagem a respeito do fruto do Conhecimento é diametralmente oposta na Bíblia e no Edda. Na Bíblia, o pecado original é que o homem coma do fruto do conhecimento, enquanto no Edda ele tem o que o próprio Odin faz ao se sacrificar na Árvore Mundial Yggdrasil. Portanto, há até mesmo um imanente de LHP inerente à tradição nórdica. Traição, abuso, assassinato de inocentes são vistos com olhos pelo menos tão infelizes no Edda quanto na Bíblia, mas a responsabilidade recai sobre o homem, não sobre qualquer figura do Diabo.

Os males são comportamentos não aceitos dos Homens. Ou o mal é mais uma força da natureza. Os Gigantes / Thurses vivem ou na terra que é tão fria que destrói tudo, ou onde faz tanto calor que tudo é queimado. A tarefa do homem é navegar em um Caminho do Meio Dourado entre esses dois princípios de Gelo e Fogo, buscar a transcendência e se tornar como os deuses. Como o deus, os adeptos freqüentemente buscam conselhos dos Gigantes. Um epíteto dos Gigantes era Hundvíss (“muito sábio”).

Para comparar com o Kundalini Yoga, o adepto será destruído apenas trabalhando com Ida, ou apenas com Pingala. É a interação entre essas duas serpentes que faz o Kundalini Shakti – O Dragão Vermelho – subir, para cumprir a profecia de Gênesis 3: 5: “Pois Deus sabe que quando você comer dele (Os Três do Conhecimento), seus olhos irão seja aberto, e você será como Deus, conhecendo o bem e o mal. ” Enquanto vampira e devoradora de vidas e da inocência, Geraldine ao menos no campo simbólico ela dialoga muito bem com essa visão mais báltica.

Mas é certo que a célebre pintura de “The Vampire” ou simplesmente “The Vamp” de Sir Philip Burne Jones desvela uma realidade muitissimo mais interessante – das relações do ocultismo inglês e da vastidão das místicas e religiões da Índia. Kali sobre Shiva quem sabe. Falamos mais disso no meu livro Sob Tuas Asas: Mística Vamp para Adultos.

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175 ANOS DE VAMPIROS BRASILEIROS NAS LETRAS E NAS ARTES E O GÓTICO CABOCLO DO CERRADO

Um gótico caboclo quem sabe. Não é algo tão estranho se você pensar. Longe de mim escrever uma tese de doutorado sobre literatura fantástica no Brasil do século XIX, apenas basta mencionar que já existia e passava bem. Mas dentro do meu papel convêm ressaltar obras sobre vampiros publicadas no Brasil há quase 175 anos atrás.

Sim você leu certo.

Em Christabel de Alex Levy encontramos algo que em essência experimentamos ao lermos histórias de vampiros brasileiros tais como Acauã de Inglês de Souza (1893) ou ainda A Mortalha de Auzira (1891). E se porventura você não conhece essas duas obras acresça imediatamente a sua lista de leituras Fome de Rodolfo Teófilo (1890) e A Maldição Materna de João Cardoso de Menezes e Souza (1847). Aliás o próprio cerrado é por si um ambiente que até hoje fascina grandes artistas, atualmente temos o Ciberpajé e seu PostHuman Tantra que já desenvolveram incontáveis abordagens estéticas futuristas e pós humanas na música, nos quadrinhos e na poesia nestas terras.

No parágrafo anterior só mencionei na sua totalidade as primeiras e mais conhecidas histórias de VAMPIROS ou simplesmente VAMPS publicadas no Brasil muito antes do Drácula de Bram Stoker. Como já afirmei antes são quase 175 anos de Vamps na literatura brasileira completos em 2021. Quase todas elas bebem na tradição vampiresca do começo do século XIX que bebe na fonte de Coleridge e a posteriore Polidori.

E se tudo isso de VAMPS BRASILEIROS lhe parece uma novidade – e você achava que era algo que só surge na chanchada televisiva dos anos noventa ou vive repetindo que nem papagaio que vampiro é mito importado – eu recomendo urgentemente que você leia este artigo originalmente publicado em 2017 para não passar mais vergonha em rodas de amigos mais nobres. De brinde vou dizer que Deuses Murciélagos eram mais comuns na América do Sul do que na Europa, bem como deidades com caninos avantajados e pajés que se trajavam de morcegos também. Sobre isso, tem mais aqui. Dai sempre pode vir alguém com o mimimi que não existiam vampiros negros e… pois é até rainha dos vampiros egípcia e negra tivemos na literatura fantástica brasileira ainda em 1903 – muito antes da Akasha da Anne Rice.

Então penso que meu amigo Alex Levy-Heller é um visionário dentro do imaginário vamp – e quando esta pandemia passar e os nossos eventos retornarem ele merece uma homenagem especial por esta realização.

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