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Barão de Paranapiacaba Pai dos Vampiros Brasileiros

A Primeira Vampira Brasileira e o Barão de Paranapiacaba:

A Primeira Vampira Brasileira e o Barão de Paranapiacaba: O intoxicante aroma noturno da vila dos Ingleses, em Paranapiacaba, sempre nos aproximou de estranhas encruzilhadas na calada da noite escura. Nesse sentido, o mês de Maio sempre foi marcante por conta de nossas atividades que integram a bela Convenção de Bruxas e Magos ao longo destes últimos 16 anos. Mas sempre houve algo na atmosfera de lá que nos inspirava. Algo escondido. Inclusive falamos disso na Vox Vampyrica Podcast desta semana. Porém, nada como este peculiar artigo que apresentarei em seguida.

Um conhecido psicanalista austríaco nomeia certos acontecimentos da vida como sincronicidades enquanto o vulgo de coincidências. Para os mais familiarizados com aquilo que é chamado de ocultismo há menções a sussurros que são recebidos em sonhos lúcidos após ritos incomuns. Este artigo, por exemplo, é um deles. Apenas um recorte de viés e de sonhos lúcidos, para aqueles que ainda sonham e voam através da escuridão, nada mais.

Requer alguma coragem para alinhar este conteúdo e o apresentar dessa maneira. Quero apenas contar uma boa história. Reavivar o interesse de todos pela poesia que originou os primeiros vampiros da literatura brasileira. E por que não, estimular o Dark tourism da Vila de Paranapiacaba. Visto que sou o precursor e introdutor do gênero na Terra brasilis, segundo pesquisas de alunos da Universidade Anhanguera – conheça nosso passeio cultural São Paulo Maldita.

Há paralelos entre a poesia do Conde de Paranapiacaba em questão e o imaginário ou atmosfera da Vila dos Ingleses e ressaltarei alguns deles. Um certo byronianismo quem sabe? Uma atmosfera? São visões interessantes e convergem para um destino ainda mais notável. Vamos contar essa história verdadeiramente atípica sobre A Primeira Vampira Brasileira, o Barão de Paranapiacaba e uma Vila muito especial para nós. 

UM POUCO DE CONTEXTO:

João Cardoso de Meneses e Sousa
João Cardoso de Meneses e Sousa

BARÃO DE PARANAPIACABA foi o título honorífico de João Cardoso de Meneses e Sousa (Santos, 25 de abril de 1827-Rio de Janeiro, 2 de fevereiro de 1915). Ele foi um poeta, jornalista, advogado, tradutor, professor e político brasileiro. Diversas foram as suas contribuições à cultura brasileira. O tema é extenso e merece uma pesquisa no google. No entanto, a tradução dos poemas “Oscar d´Alva” e também “The Giaour” do grande Lord Byron (traduzida por ele em 1857) não me faria estranhar ele ter sido um rebelde byroniano – que entendeu a mensagem do inglês. O fato de ter sido condecorado como barão aos 56 anos aparentemente causou a costumeira birra acadêmica brasileira e a estranha ausência de uma menção digna dele como o criador dos primeiros vampiros brasileiros na literatura.

Santista, também foi maçom e mais um filho prodigioso da Faculdade de Direito do Largo São Francisco. Aliás, sempre nutriu um apreço pela nuance vampírica, vemos isso na tradução de “Giaour” de Byron e ainda na versão que escreveu de Lenore inspirada na obra de Gottfried August Bürger. Contam que João escutou o amigo Antônio Joaquim Ribas narrar tal balada que também inspirou autores Mathew “Monk” Lewis e tantos outros – e como esta pode ter sido a inspiração de Octávio e Branca – Maldição Materna. E dada a época que João viveu sua juventude, não estranharia vê-lo ao lado dos amigos Álvares de Azevedo e Bernardo Guimarães. Até mesmo indago se ele frequentou a mórbida Casa Negra (que antes dos poetas havia sido a primeira Santa Casa de São Paulo), próxima ao Cemitério dos Aflitos, em São Paulo imortalizada nos escritos de Azevedo em Macário. (Aliás temos alguns artigos incríveis sobre Alvares de Azevedo, da pesquisadora Luciana Fátima)

Mas há muito, muito mais sobre este barão que merece vossa pesquisa meus nobres amigos e amigas. Ele era alguém que entendia o tom aquariano de Byron, inclusive ao ler este trecho a seu respeito, admito que ele conquistou meu respeito:

“Embora idolatrasse Byron, João Cardoso repudiava os entusiastas que, tomando-o por um arquétipo de delinquência, alarmou a Justiça paulistana ao empreender crimes piores “do que a ficção da maior parte das novelas de ‘terror gótico’” O desafio não era, segundo ele, perambular por cemitérios a vilipendiar cadáveres ou gabar-se de ter participado de delitos; mas esmerar-se em compreender sua poesia, sua postura ante as agruras de seu percurso e, por fim, as ações que o mitificaram como um mártir libertário.

A devoção do santista aos versos “sombrios e tenebrosos” do Lorde inglês ofereceu lhe elementos que comporiam os esboços da trindade herética que ele esboça em seu prefácio. Byron seria um “gênio da irrisão sentado sobre as ruínas do universo” que, encarnado como poeta, viveu como “hóstia votada ao sacrifício”. Por sua vez, cada poema
de Lamartine seria “uma gota de maná celeste derramado sobre as úlceras sangrentas do coração”. Pai, Filho e Espírito Santo? Em sua liturgia romântica, Gonçalves de Magalhães era visto como uma espécie de apóstolo – o “chefe de nossa escola moderna” – e, finalmente, aos poetas cabia a missão de “orvalhar a terra com as lágrimas da
desesperação”.
Patágios Fúnebres: Uma leitura vampírica de Otávio e Branca, Cid Vale Ferreira

Foi amigo e conselheiro da Ordem da Rosa, do Imperador Dom Pedro II, que lhe concedeu a titularidade de Barão de Paranapiacaba, por volta de 1883, quando ele já estava com 56 anos. De rebelde byroniano, pilar do romantismo maldito brasileiro; acabou se tornando o pai dos romances vampíricos da nossa terra. Isso sim é uma história de vida! Dessa maneira o Imperador homenageou seu nobre conselheiro, pelo amor e intimidade que este nutria pela sua sua terra natal, imortalizada no seu poema ”A Serra de Paranapiacaba” – que pode ser lido neste outro site.

Mas sem dúvida dentre tantas obras fantásticas a que mais nos interessa é “Octávio e Branca – A Maldição Materna. Desenvolvida entre 1845 e 1849, entre os 18 e 22 anos de João Cardoso (já mencionei que ele foi um autêntico rebelde byroniano?) Esta que acaba sendo a primeira poesia sobre vampiros que se conhece aqui no Brasil! E que já vem sendo mencionada há anos na Rede Vamp como referência e pode ser apreciada aqui, aqui e aqui também. Assim como apresentamos este conteúdo ainda em 2019 no álbum Despertar Vamp, disponível em nossa loja.

Branca Holibachis
Branca Holibachis, a primeira vampira da literatura brasileira criada pelo Barão de Paranapiacaba

BRANCA HOLIBACHIS é o nome da Vampira da poesia Octávio e Branca, a maldição materna, escrita pelo João Cardoso de Meneses e Sousa entre 1845 e 1849 durante sua juventude. Vamos só lembrar que ele apenas se tornou Barão em 1883, aos 56 anos. Ainda assim, se temos como ícone um Lorde Byron na Inglaterra – porque não podemos ter um Barão de Paranapiacaba, bem aqui no Brasil, não é verdade? Nós da Rede Vampyrica afirmamos que Sim!

Branca é a primeira vampira da literatura brasileira par excelence. O que levaria muitos de vocês pensarem que Octávio seria o primeiro vampiro brasileiro, mas ele não foi. A primeira menção ao termo “Vampyr” se dá na poesia “A Noite” de Silva Alvarenga, ainda nos 1800´s usada pelo “Eu Lírico” do poeta mineiro. Falaremos disso neste outro artigo.

O ator Rodrigo Gallo, inspirado neste post gravou alguns trechos de Octávio e Branca no seu canal do Youtube

O romance que se finda em tragédia é e sempre será de natureza vampírica sob o olhar dos seus apreciadores. Neste sentido a história do Médico Mouro e outros da Vila de Paranapiacaba se torna convergente e interessante neste curioso viés. Pequenos relatos de amores trágicos e populares guardados sob o véu da noiva, neste caso a névoa.

Sabemos que a personagem Branca tem sua inspiração e fonte em clássicos como Lenore de Gottfried August Bürger – e falamos mais deste importante texto, neste outro artigo. E também nas primeiras vampiras enevoadas e espectrais da literatura. O que nos leva a tradição das noivas vampíricas em busca ou a espera do amado. Falamos longamente delas, aqui. Não deixa de ser curioso. Neste sentido, o folclore a respeito do véu da noiva, na vila de Paranapiacaba, que é a maneira como a descida da névoa do alto das montanhas é chamada por lá.

Paranapiacaba, Vila dos Ingleses
Paranapiacaba, Vila dos Ingleses

A VILA DE PARANAPIACABA tem sua história e origens ligadas a Estrada de Ferro que liga o Porto de Santos ao interior paulista e foi inaugurada em meados de 1896. A ocupação no entanto já vinha por ali desde 1859. Começando quando o Barão de Mauá idealizou uma estrada de ferro para facilitar a exportação da produção do interior do estado até o Porto de Santos e, de lá, para o mundo. Logo se juntam a ele uma notável empresa inglesa, barões do café e grandes investidores. Aí temos as origens da São Paulo Railway Company LTD.

Em pouco tempo, a região onde hoje está a Vila de Paranapiacaba, passa a abrigar quase 5000 pessoas que trabalhavam por lá. As obras se iniciam ainda em 1862 e a inauguração se dá em 1867. Cerca de 11Túneis (Sim 11 Túneis!) foram escavados sem explosivos nas rochas para evitar desmoronamentos. E sem dúvida muito, muito sangue foi derramado e vidas perdidas na construção desta estrada de ferro. O que rendeu muitos relatos de avistamentos, assombrações e personagens curiosos dispersos nas névoas de lá. Muito disso foi reunido através do século pelos pelos moradores mais idosos de lá e que tinham a ferrovia no seu passado.

Mortes acidentais ou violentas, sangue, pedreiras e ferro formam estranhos vínculos ente os mundos. E o folclore, o imaginário, a bruxaria ou ainda o vampirismo são uma espécie de antologia disso, aliás quem poderiam ser os espíritos associados a tais seres para os povos nativos brasileiros? Tentamos responder aqui.

Existem histórias pontuais a respeito da severidade e disciplina rígida do engenheiro Daniel M. Fox que morava no chamado Castelinho de onde vigiava toda a vila e há muitas notas sobre seus excessos na administração local.

Até o momento que desenvolvemos este artigo (maio/2022) desconhecemos o papel do Barão de Paranapiacaba durante este processo. Sabemos que ele estava vivo na época, afinal faleceu apenas em 1915. Mas desconhecemos se ele retornou ou visitou a vila quando esta foi construída. Inclusive, se alguém que ler este artigo tiver mais informações a respeito desta notória lacuna, escreva para a gente.

Todavia, não deixa de ser interessante como muitos dos relatos folclóricos da Vila dos Ingleses recordam passagens de sua obra Octávio e Branca – A Maldição Materna. Talvez por conta dele ser alguém que conhecia bem a região onde se instalaria o futuro vilarejo nas décadas posteriores. Ou quem sabe por conta de expressar atavismos recorrentes e muito especiais? Névoa, arquitetura inglesa que destoa do modelo português e brasileiro do século retrasado… adoráveis estéticas e seus estranhamentos e encantos.

O nome Paranapiacaba significa para alguns “Lugar que se vê o Mar” como já escrevia o Frei Gaspar da Madre de Deus; que viveu no século XVIII. Já para os pesquisadores do começo do século XX era o “caminho até o velho porto”, como pontua o tupinólogo João Mendes de Almeida, na obra Dicionário Geográfico da Província de São Paulo (1902).

Segundo consta o nome primitivo de onde fica Paranapiacaba é Capetevar (Caá.apité.á), que significa “o monte mais alto” (da serra), o que condiz com o nome original da estação que foi “Alto da Serra”. O monte mais alto é particularmente de onde se vê mais claramente a totalidade e que é demandando o esforço e a habilidade da escalada. O arquétipo Vamp tem uma relação profunda com isso. Sempre muito especial na espiritualidade e na mística de nossa comunidade Vamp. Mas disso não falarei e deixo para meus leitores e leitoras da série Codex Strigoi ou ainda assinantes do Campus Strigoi.

Rito de Cosmovisão Vampyrica, realizado em 14.05.2022 celebrando 16 anos da Comunidade Vamp do Brasil no evento Convenção de Bruxas e Magos de Paranapiacaba

CONCLUSÃO: Nos dias de hoje, Paranapiacaba é uma referência internacional por conta de eventos grandiosos que tomam toda a sua extensão como a Convenção de Bruxas e Magos de Paranapiacaba da Universidade Holística Casa de Bruxa. Lá também se realiza o Festival de Inverno de Paranapiacaba e a rota gastronômica do Cambuci. Outro destaque mais recente é a sede da ABB – Associação Brasileira de Bruxaria. E para nós da Comunidade Vamp do Brasil a Vila dos Ingleses carrega a memória afetiva de nos reunir por lá desde 2006 para as palestras de Lord A durante a convenção de bruxas, as diversas edições do Sarau Jardim de Perséfone e desde 2013 pela realização do Rito de Cosmovisão Vampyrica.

A Vila dos Ingleses também é conhecida pelo folclore extremamente rico com histórias sobre personagens fantásticos, assombrações e muito mais. É interessante notar que o cineasta José Mojica Marins, intérprete do personagem Zé do Caixão, filmou alguns de seus projetos no sótão do velho castelinho do engenheiro Daniel M. Fox nos anos setenta.

A extinta rede de televisão Tupi e posteriormente a emissora Bandeirantes filmaram sua adaptação do romance Drácula. Ela foi intitulada “Um Homem Muito Especial” e filmada na vila dos ingleses na mesma época. A novela contou com a participação de Bruna Lombardi e Carlos Alberto Ricceli. Então, certamente os leitores e leitoras da Rede Vamp não são os primeiros “Vamps” de Paranapiacaba – mas talvez sejam os mais longevos – afinal, estamos lá desde 2006 e com o distanciamento da pandemia estaremos muito mais presentes por lá.

Aprecio a noção de “Atmosfera” como uma noção de repertório, prado ou universo. Algumas pessoas podem brincar com a ideia de registo akáshico ou derivados neste mesmo rumo. Não deixo de pensar como é interessante a primeira poesia de vampiros da literatura brasileira ter sido escrita por um jovem rebelde byroniano; e como já na idade adulta ele se tornou o Barão de Paranapiacaba. Ainda que desconheça se houve ou não uma relação objetiva dele como proprietário das terras sob este nome, a atmosfera da região ganha mais charme. Um lugar tão convergente para com esta atmosfera sombria, elegante e estranhamente encantadora e familiar para todos nós ao longo destas últimas duas décadas.

Deixo outras vinculações e especulações a respeito da poesia Octávio e Branca e do folclore de Paranapiacaba, ao encargo de quem assistir o vídeo que segue:

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